“O Senhor escolheu outros setenta e dois discípulos e os enviou dois a dois, à sua frente, a toda cidade e lugar aonde Ele próprio devia ir.” (Lc 10,1)
A Palavra de Deus sempre diz mais do que as palavras aparentam. Nada na Sagrada Escritura é acidental — inclusive os números.
O número 72, que aparece neste Evangelho, não é meramente estatístico. Ele carrega um significado simbólico e espiritual, que a Liturgia nos convida a contemplar.
Setenta e dois discípulos enviados.
Na linguagem bíblica, o número 72 representa a universalidade da missão. Em Gênesis 10, encontramos a tabela das nações — 72 povos descendentes de Noé — símbolo de toda a humanidade. Jesus envia 72 discípulos porque deseja que o anúncio do Reino chegue a todos. A missão é universal. “Ide e pregai o Evangelho a toda criatura” (Mc 16,15).
Mas há ainda uma leitura mais profunda:
72 = 12 x 6.
O número 12 simboliza o povo de Deus (as 12 tribos de Israel, os 12 Apóstolos). Já o 6, na simbologia bíblica, representa a imperfeição, a incompletude do homem.
Isso nos lembra que todo batizado é chamado à missão. Porém, quando alguém tenta viver a fé de forma isolada, ou interpreta a Palavra somente com critérios pessoais, corre o risco de anunciar um evangelho incompleto. Como advertiu São Jerônimo: “Fora da Igreja, a interpretação se perde.”
E então, a chave está num detalhe do Evangelho: “O Senhor escolheu OUTROS setenta e dois.”
Esses “outros” não são independentes, não estão sozinhos: eles acompanham os Doze. Estão unidos à Igreja. A missão é autêntica quando nasce da comunhão com os Apóstolos, com a Mãe Igreja.
Nesse momento, o 6 imperfeito se transforma:
12 x 7
O 7, número da perfeição bíblica (os dias da Criação, os dons do Espírito), representa a plenitude da ação divina. Quando o missionário se une à Igreja, sua missão se torna fecunda e santa.
É por isso que, na primeira leitura, o profeta proclama: “Alegrai-vos com Jerusalém, exultai por ela todos vós que a amais!” (Is 66,10)
Jerusalém é figura da Igreja. Quem ama a Igreja, alegra-se com ela. Quem permanece nela, encontra abrigo, proteção e verdadeira interpretação da Palavra. Como nos recorda Santo Agostinho: “Não pode ter Deus por Pai quem não tem a Igreja por Mãe.”
Se amas a Igreja, alegra-te com as alegrias dela. E grande consolação esse amor lhe será.
Na missão, não vamos sozinhos. Vamos com Cristo e com a Igreja. Por isso, a missão é sempre fonte de alegria — não por causa dos resultados, mas por causa da comunhão com o Senhor. Como diz Jesus aos discípulos, ao voltarem cheios de entusiasmo:
“Alegrai-vos antes, porque vossos nomes estão escritos no céu.” (Lc 10,20)
A verdadeira alegria está em saber que pertencemos a Deus, que Ele nos confiou uma missão e que nos acompanha com sua graça. Essa alegria é plena quando não caminhamos sozinhos, mas como filhos de uma Igreja viva e missionária.
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