Categorias

Eis 20250418 153109 0000

Eis o lenho da Cruz

“Eles olharão para aquele que transpassaram” (Jo 19,37)

Nesta Sexta-feira da Paixão, a Igreja se recolhe em silêncio, em jejum e oração. O altar está desnudo. O Cordeiro foi imolado. A cruz se ergue como trono, escândalo e salvação. E, diante dela, contemplamos o mistério maior da fé cristã: o Deus que morre por amor.

Três discípulos nos ajudam a mergulhar nesse mistério: João, Pedro e Judas. Três nomes. Amar, negar e trair. Três atitudes. Três respostas humanas diante do sofrimento redentor de Cristo.

Os números são muito presentes na catequese divina perfeita, e nos falam mais do que podemos ver.

O três mostra a totalidade de algo. Três atitudes. Poderíamos pensar: O bem; quem queria fazer o bem, mas fez o mal; e o mal. Observemos os três apóstolos:

Judas, o traidor, entregou Jesus por trinta moedas de prata (Jo 18,2-5). Pela guematria hebraica, cada letra do nome hebraico de Judas (I-H-U-D-H) soma exatamente 30: 10 + 5 + 6 + 4 + 5. Trinta moedas, trinta como o valor do próprio nome. Como o valor da sua própria vida.

Um número simbólico: três, a totalidade de Deus, a Trindade; dez, o número da plenitude. Judas traiu completamente o Divino.

Ele administrava o dinheiro de maneira corrupta. Ouvia os ensinamentos de Cristo, mas seu coração era como a terra com espinhos, onde a semente brotou e a planta foi sufocada pelos espinhos e morreu sem dar frutos. Pior que isso, seu trigo morreu e o joio se espalhou. Oferecendo um cenário perfeito para Satanás implantar-lhe os pensamentos humanos sobre os pensamentos de Seu Mestre.

E como diz São João Crisóstomo: “O diabo não tem poder sobre nós, a menos que lhe abramos a porta.”

Pedro, o impulsivo, o amigo próximo, o líder entre os apóstolos. Durante a Última Ceia, Jesus lava-lhe os pés, e ele, sem compreender, reage: “Tu nunca me lavarás os pés” (Jo 13,8). Mas depois se entrega: “Senhor, lava-me por completo.” Pouco depois, no Horto das Oliveiras, este mesmo líder impulsivo ergueu a espada para cortar a orelha do soldado romano (Jo 18,10), sem entender que o caminho da cruz é feito de mansidão.

E, por fim, no pátio do sumo sacerdote, Pedro perdeu Cristo de vista, e caindo sobre seus próprios sentimentos começou a afundar. Perdeu o seu chão, e quando confrontado com a verdade, ele O negou! Não apenas uma, mas três vezes!

Mas ao cantar do galo, que simboliza o nascer de um novo dia, Pedro foi alcançado pela luz do olhar de Cristo. O que fez seu coração voltar a si. Reconhecendo sua culpa e assumindo sua fraqueza, que não poderia ser nada sem o Cristo!

Como nos ensina São Gregório Magno: “Foi pelo olhar de amor que Pedro se arrependeu; porque o olhar de Jesus penetrou até a raiz da sua alma.”

João, o discípulo amado, era o discípulo de confiança que senta ao lado do Cristo, reclina sua cabeça no peito de Jesus (Jo 13,23), escuta os batimentos do Coração de Deus. Ele não foge. Ele permanece. Também é o apóstolo que chorou ao seu lado, sentiu cada açoite como se fosse em suas costas. Estava ao lado de Cristo no Calvário, provando seu amor na dor. E representou toda a humanidade recebendo Maria como Mãe.

Porém, apesar de amá-Lo verdadeiramente, Pedro e João também são humanos, são falhos. No Getsêmani, foram vencidos pelo cansaço, pois Cristo os convidou para orar, e dormiram no momento mais difícil da vida de Jesus, onde Ele confrontaria os sentimentos humanos e sentiria o peso da humanidade, o suficiente para suar sangue!

A nossa tríade de atitudes, a totalidade humana, mesmo assim, ainda somos falhos.

Mesmo aquele que só queria o bem, até ele, caiu sobre o seu “eu natural”. Dormiu quando chegou no seu limite e abandonou o Cristo.

Pois sozinho não somos capazes do perfeito bem. Pois o Perfeito Bem é uma pessoa e não uma atitude!

Ele morreu por nós, e a cruz foi o instrumento de salvação.

Como escreveu São Bernardo: “A cruz é a cátedra do Mestre, o altar do Sacerdote, o trono do Rei.”

Hoje, ao adorarmos a Santa Cruz, não adoramos o sofrimento em si, mas o amor que se entregou até o fim. Como canta a liturgia: “Eis o lenho da cruz, do qual pendeu a salvação do mundo. Vinde, adoremos!”

Na Paixão segundo São João, ouvimos: “Inclinando a cabeça, entregou o espírito” (Jo 19,30).

É o ponto culminante da história da salvação. O véu do templo se rasga, a terra treme, e o coração da humanidade é novamente alcançado pela Graça.

Por fim, rezemos com a oração do dia do Missal Romano:

“Ó Deus, pela Paixão de nosso Senhor Jesus Cristo, destruístes a morte, que herdamos do antigo pecado, e, por sua Ressurreição, restaurastes a vida. Concedei que, celebrando este mistério, sejamos santificados pelo dom do vosso amor. Por Cristo, nosso Senhor. Amém.”

No Eco da Palavra, buscamos refletir sobre os detalhes das leituras diárias que podem passar despercebidos nas homilias. Cada versículo tem uma riqueza infinita, e aqui, ecoamos essas pequenas grandes revelações para alimentar a fé e aprofundar a vivência da Palavra de Deus no dia a dia.