Categorias

483598805 17852885058406822 537395028754124108 n

2º Domingo da Quaresma, Ano C

Quantas vezes estamos sem força? Em desespero, sentindo-se abandonados por Deus. Quantas vezes a ansiedade nos aperta o coração e nos joga contra a parede?

Abraão estava, assim como nós, nas leituras do segundo domingo da quaresma.

Sua idade já era avançada, e nada das promessas de Deus se cumprirem na sua vida.

Passaram-se cerca de vinte e cinco anos do anúncio de Deus para Abraão, que sua descendência formaria uma grande nação, mas nenhum filho veio abençoar o seu lar.

Numa noite escura, noite da alma, Abraão, não mais se conteve e perguntou:

“Meu Senhor Deus, que me darás?” (Gn 15,2)

Deus, então, conduziu Abraão para fora e disse-lhe:

“Olha para o céu e conta as estrelas, se fores capaz! Assim será a tua descendência” (Gn 15,5)

Deus tira Abraão do seu mundinho, de seu modo de ver estreito, da sua angústia, e convida-o a ver e sentir com os olhos e o coração do próprio Deus.

“Abraão teve fé no Senhor, e isso lhe foi creditado como justiça” (Gn 15,6)

Abraão esperou com toda esperança, creu contra toda probabilidade, apostando tudo no Senhor, apoiando Nele todo seu futuro, todo o sentido de sua existência! Abraão creu!

Por isso Deus o considerou seu amigo, “considerou isso como justiça!” E, como recompensa, Deus selou uma aliança com nosso Pai na fé.

Na tradição antiga, quando uma pessoa que possuía bens fazia uma aliança com seu servo, cortavam-se animais ao meio e os dispunham como um corredor. O servo então passava entre as metades, declarando que, se quebrasse o pacto, mereceria o mesmo destino dos animais sacrificados. Assim era selada uma aliança.

Deus pede a Abraão que prepare esse ritual:

Toma-me uma novilha, uma cabra e um carneiro, todos com três anos, além de uma rolinha e um pombinho” (Gn 15,9)

Abraão trouxe tudo e dividiu os animais ao meio. Aves de rapina se precipitaram sobre os cadáveres, mas Abraão as enxotou. Quando o sol ia se pondo, caiu um sono profundo sobre Abraão e ele foi tomado de grande e misterioso terror.

Assim como aves de rapina, nossos maus pensamentos, medos e pesadelos nos rondam e afligem quando estamos na noite escura.

Abraão entra em crise: no meio da noite – noite cronológica, atmosférica; noite no coração de Abraão e o sono provocado pelo desânimo e a tristeza, rondam nosso Pai na fé… Deus demora, Deus parece ausente, Deus parece brincar com Abraão! Tudo é noite, como muitas vezes na nossa vida e na vida do mundo! Mas, ele persevera, vigia, luta contra as aves rapineiras e o torpor… E, no meio da noite e da desolação, Deus aparece, como uma tocha luminosa.

Na tradição, o servo atravessaria as carcaças apostando a sua vida pela sua palavra, pela sua aliança. Porém, quem toma a iniciativa e faz a passagem é o próprio Deus. O fogo divino desceu do céu e consumiu os animais.

“Quando o sol se pôs e caiu a escuridão, apareceu um fogo fumegante e uma tocha ardente que passaram por entre os pedaços dos animais” (Gn 15,17)

Aqui está o grande mistério: não foi Abraão que passou entre os animais, mas o próprio Deus!

Deus assumiu sobre si as consequências do pacto, mostrando que Sua fidelidade não depende do homem, mas de Seu próprio amor eterno.

“Naquele dia, o Senhor fez uma aliança com Abraão” (Gn 15,18)

Abraão perseverou, creu, combateu, vigiou – e a escuridão se transformou em luz!

“O Senhor é minha luz e minha salvação: de quem terei medo?” (Sl 26,1)

Séculos depois, no Monte Tabor, a promessa feita a Abraão encontra seu pleno cumprimento em Cristo.

Jesus sobe ao monte com Pedro, Tiago e João. E então, diante deles, a glória divina irrompe:

“Enquanto orava, seu rosto se transfigurou e suas vestes ficaram brancas e brilhantes” (Lc 9,29)

Moisés e Elias aparecem e falam com Ele sobre sua Paixão. Eis o mistério: a Luz da Transfiguração antecipa a Glória da Ressurreição, mas só será plenamente manifestada depois da Cruz!

“É necessário que passemos por muitas tribulações para entrar no Reino de Deus” (At 14,22)

Pedro, deslumbrado, quer permanecer ali, mas Deus Pai intervém:

“Este é o meu Filho, o Escolhido. Escutai-o!” (Lc 9,35)

A mensagem é clara: Cristo é a verdadeira luz que dissipa todas as trevas! Ele não apenas revela a glória futura, mas caminha conosco no presente, assumindo nossas dores.

“O mesmo Senhor caminhará diante de ti; Ele estará contigo, não te deixará, nem te abandonará” (Dt 31,8)

Assim como Abraão, também passamos por noites escuras. A dúvida nos assalta, as promessas de Deus parecem distantes, e o medo tenta nos paralisar. Mas a lição da Quaresma é clara: perseveremos!

Deus não falha! Ele ilumina a noite, sela Sua aliança conosco e nos transforma em filhos da luz.

“No mundo tereis aflições. Mas tende coragem: Eu venci o mundo!” (Jo 16,33)

A Luz venceu! A esperança triunfa! Cristo, transfigurado no Tabor, é a certeza de que também seremos transfigurados Nele!

Confiemos e sigamos firmes, pois na hora certa, o Senhor afastará toda treva e nos envolverá com Sua Glória!

No Eco da Palavra, buscamos refletir sobre os detalhes das leituras diárias que podem passar despercebidos nas homilias. Cada versículo tem uma riqueza infinita, e aqui, ecoamos essas pequenas grandes revelações para alimentar a fé e aprofundar a vivência da Palavra de Deus no dia a dia.